berenice
não sabia se era alice ou berenice. não que em muitos momentos não soubesse a diferença entre ser uma ou outra, alice ou berenice! alice transpunha espelhos. vivia o que berenice não conseguia. porque, berenice, era pura realidade feito concreto de parede. alice não. alice voava longe sobre paraísos e sonhos. nuvens ocultas em qualquer pensamento etéreo era alice. naquele momento, refletindo, não sabia. era alice? berenice? alguém se aproximou num choro lacrimoso, operístico, até muito exagerado, teatral. o teatro é prato cheio destas ocasiões. quem via o choro de quem olhava? essa era a questão. porque alice riria. porém, berenice, choraria. um canto ao longe ecoou algo familiar. berenice ou alice pôs-se a escutar. alice voou. berenice ouviu através do vidro que encobria seu rosto pálido. neste momento berenice não pode dar as mãos à alice. percebeu que ficara. ficara imóvel. estática. alguém num sussurro falou. berenice tão quieta. berenice tão calma. berenice menina doce. num turbilhão de idéias, nem berenice nem alice , algo moveu fundo. acordando vontades. sonhos. planos. ainda haveria tempo? espaço? momento para berenice? alice sempre voara. cantara. era alguém além da realidade. berenice, pés no chão, mal conseguira saber que existia uma linha além do horizonte. o vidro ficou nítido. separava um rosto pálido de uma realidade colorida. berenice tentou chamar alice. mas...ela se despedia, acenava. este não era seu ato. alice era eterna. mãos encostavam no vidro deixando aquela marca passageira. pareciam se lamentar. por quem? por quem não voara? ou por quem ali estava, esperando? alice fora alguma inspiração. alice atravessou o espelho. berenice via, agora, o bafo de uma respiração num vidro espesso. muito espesso. tentou tocar, abrir. tarde demais. alice corria velozmente se perdendo ao longe. berenice ficou. de repente vozes em coro rezaram. berenice, atenta, sempre, não rezou. por mais que quisesse não fazia mais parte do coro. do canto. do choro. era ela mesma o fim. o vidro espesso refletia algumas imagens. a mãe, o pai, as irmãs, poucos amigos e colegas. poucos seres humanos. menos alice. ela não fazia parte. ela era o que nunca fora berenice. por isso, naquele momento, não adiantaria chamar. alice fora na frente. berenice, ficara. alguma luz ainda via. mas...de repente vozes, cantos, mãos, orações. berenice se fechou. fecharam berenice. na escuridão ouviu a terra que caía, pá a pá sobre o que lhe restara. a imagem de alice que sorria.
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